sábado, 12 de fevereiro de 2011

Antes que eles cresçam!


Há um período em que os pais vão ficando órfãos dos próprios filhos.

É que as crianças crescem. Independentes de nós, como árvores, tagarelas e pássaros estabanados, elas crescem sem pedir licença. Crescem como a inflação, independente do governo e da vontade popular. Entre os absurdos dos preços, os disparos dos discursos e o assalto das estações, eles crescem com uma estridência alegre e, às vezes, com alardeada arrogância.

Mas não crescem todos os dias, de igual maneira; crescem, de repente.

Um dia se assentam perto de você no terraço e dizem uma frase de tal maturidade que você sente que não pode mais trocar as fraldas daquela criatura.

Onde e como andou crescendo aquele rapazinho que você não percebeu? Cadê aquele cheirinho de leite sobre a pele? Cadê a pazinha de brincar na areia, as festinhas de aniversário com palhaços, amiguinhas e o primeiro uniforme do maternal?



Entre hambúrgueres e refrigerantes nas esquinas, lá estão eles, com o uniforme de sua geração: incômodas mochilas da moda nos ombros ou, então com o moletom amarrado na cintura. Está quente, a gente diz que vão estragar o moletom, mas não tem jeito, é o emblema da geração.

Esses são os filhos que conseguimos gerar e amar, apesar dos golpes dos ventos, das colheitas, das notícias e da ditadura das horas. E eles crescem meio amestrados, vendo como redigimos nossas teses e nos doutoramos nos nossos erros.

Há um período em que os pais vão ficando órfãos dos próprios filhos.

Longe já vai o momento em que os primeiros pelos do rosto foi recebido como um impacto e quando surgiam entre gírias e canções. Passou o tempo de brincar com o papai e com a mamãe, trocar as fraldas, de empinar pipa e segurar aquela criança tão pequena e frágil envolto em meus braços. Saíram do banco de trás e passaram para o volante de suas próprias vidas.

Deveríamos ter ido mais vezes à cama delas ao anoitecer para ouvir sua alma respirando, conversas e confidências entre os lençóis da infância, e os adolescentes cobertores daquele quarto cheio de colagens, posteres e agendas coloridas de pilo.

Eles cresceram sem que esgotássemos neles todo o nosso afeto.

No princípio subiam a serra ou iam à casa de praia entre embrulhos, comidas, engarrafamentos, natais, páscoas, piscinas e amiguinhos. Sim, havia as brigas dentro do carro, a disputa pela janela, os pedidos de sorvetes e sanduíches infantis. Depois chegou a idade em que subir para a casa de campo com os pais começou a ser um esforço, um sofrimento, pois era impossível deixar a turma aqui na praia e as primeiras namoradas. Esse exílio dos pais, esse divórcio dos filhos, vai durar sete anos bíblicos. Agora é hora de os pais na montanha terem a solidão que queriam, mas, de repente, exalarem uma contagiosa saudade daqueles que nos deixaram de cabelos em pé muitas vezes.

O jeito é esperar. Qualquer hora podem nos dar netos. O neto é a hora do carinho ocioso e estocado, não exercido nos próprios filhos e que não pode morrer conosco. Por isso, os avós são tão desmesurados e distribuem tão incontrolável afeição. Os netos são a última oportunidade de reeditar o nosso afeto.

Por isso, é necessário fazer alguma coisa a mais, antes que eles cresçam.

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